domingo, 8 de janeiro de 2017

DESASTRADA INICIAÇÃO, by Roberto Costa

A infância, como fase da vida em que se inicia o aprendizado de mundo, de experienciar novidades, é momento de muita riqueza, haja vista que através desse empirismo vamos tomando pé de tudo, descobrindo novas coisas e relações. Acredito que todos, independentemente da idade que venham a ter, guardam preciosas lembranças (quando se foi feliz) dessa passagem maravilhosa, porque tudo impressiona mais o sistema nervoso infantil, as descobertas são sempre marcantes.

Havia de ser o ano de 1949, ( Oh Deus!), eu com meus sete anos de experiência morava com a família numa casa aos fundos da avenida Mauro Ramos, cercanias do que hoje é a Escola Técnica, no meio de um pequeno feudo gramado, de acesso livre e de público desfrute. No natal ganhara de presente, além de uma cestinha com chocolates, um pião de lata, de um raro vermelho que maravilhava, furta-cor, brilhante, que se fazia girar pressionando para baixo o seu cabo metálico, também um ioiô, e a primeira bola de futebol, linda, amarela, que se tornou minha companheira diária.

Levei numa certa manhã a companheira para passear no grande campo. Foi o dia em que fui iniciado no futebol. Seguia abraçado com ela, redonda e vistosa junto ao peito, tão vistosa que foi de imediato percebida por um grupo de rapazes de mais idade, os quais se alvoroçaram diante da gorduchinha ainda virgem que eu carinhosamente conduzia. - Hei, guri, vamos jogar?! -Gritou um deles. - Vamos. - Eu disse. Afinal, a bola existia para seguir sua vocação.

De imediato os maiores se apossaram da bola, examinaram-na com olhos experientes, ouvi um deles dizer que não era "oficial", o que não lhes diminuiu o encantamento, o que pra mim nada significou. Diante de mim decidiram num par-ou-ímpar quem escolheria o primeiro companheiro e assim, alternado-se na escolha, definiram os dois times. Ainda havia eu, pequeno e naquele momento  totalmente desconhecedor do maravilhoso esporte bretão, mas, afinal, dono da bola, credencial que costuma ser importante como condição de acesso ao jogo.

- Guri, tu jogas no gol? - Perguntou-me um deles. Ser designado para o gol é destino irrecorrível, é mais uma dessas sinas do futebol de pelada que acomete os menores, assim como acomete também quem não tem o bom drible, a boa medida no passe. A esses, sem intimidade com a gorducha, consta que ainda podem ser bons beques de estouro, mas se a falta de jeito é de molde a comprometer até essa grosseira função, o último recurso desses infelizes será também abraçarem-se com a solitária e maldita condição de goleiro. - Jogo. - Eu respondi.

Foi assim que, na ausência de traves, me colocaram entre duas pedras que faziam as vezes de postes laterais. O máximo que eu sabia da função era que goleiro podia impunemente pegar a bola com a mão. Deram a saída e eu fiquei a ver minha bola divertindo a todos, correr de pé em pé pelo gramado. Súbito, um atacante adversário bem lançado veio livre e em desabalada corrida na minha direção, conduzindo com habilidade a amarelinha. Alguém do meu time gritou ansioso, olhando-me com aflição: - Sai do gol! Sai do gol!

Traído pela pouca prática, eu não corri em direção ao atacante, eu literalmente saí do gol, melhor, abandonei, descambei para a esquerda, correndo sobre o que seria a linha de fundo, sem entender a razão da ordem gritada. O atacante entrou com bola e tudo, rindo com todos do seu time. Os do meu time, desconsolados, convidaram-me a assumir a função de assistente, colocaram um da linha no meu lugar, e puseram-me sentadinho na linha de fundo, com direito a torcer, caso quisesse.

* Roberto Costa é associado do Avaí FC

6 Comentários:

Fernando TS disse...

kkkkkkkkk muito divertido o texto.


Forte abraço

Fernando

Roberto disse...

Parodiando a Globo, vale a pena ler de novo.
Mesmo após tantos anos, é memória vívida em minha mente.
Beleza de ilustração, André. Abraço. RC

André Tarnowsky Filho disse...

Fernando TS,

Acho que o RC não teria vaga no nosso Avaí, né?
Ou dependeria do empresário? hehehehe

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