sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

FIQUEI A PENSAR NA RELATIVIDADE, by Roberto Costa

À época em que o Clube Doze tinha sua sede à rua João Pinto, havia a seu lado um terreno baldio, que vez ou outra servia de sede para algum empreendimento temporário. Algum pequeno parque, ou coisa do gênero ali se instalava e em uma quinzena, no máximo, partia para explorar outra praça.

Certa noite, quando por ali passava, deparei-me com uma estrutura montada, semelhante a algumas bancas de revista, de paredes metálicas. Era um stand de tiro ao alvo, com um balcão, um atendente que era o próprio proprietário e espingardas de pressão, que disparavam pequenas setas, as quais a gente visava acertar as moscas de três alvos. Ao fundo, à direita dos alvos, numa prateleira de forma triangular, os prêmios a serem conquistados conforme a pontuação que se obtivesse, os quais variavam entre caixinhas de chicletes Adams, pacotes de balas, simples maços de cigarros, até o prêmio maior, instalado significativamente no topo da estante, uma vistosa e solitária garrafa de champanhe, de péssima qualidade.

O proprietário, um microempresário, com todas as acepções constritivas e deprimentes que a palavra micro pudesse lhe acrescentar. Não me dei ao trabalho de verificar, mas talvez não tivesse sequer um alvará de funcionamento. Fiquei a imaginar as distâncias de toda ordem a vigorarem entre ele e mister Rockefeller, empresário e milionário top da época.

Segundo o ideário popular, as armas daqueles estabelecimentos não eram honestas, passavam por um processo qualquer de forma a produzirem um desvio de rota ao tiro, maneira de assegurar o lucro do proprietário. Um pecadinho como esses tantos que nos impõem os grandes empresários, mas que, neste caso, em razão da grandeza dos negócios, rendem consideráveis fortunas, aí mister Rockefeller, que entendia dessas coisas.

Nenhum dos prêmios me atraía, mas a troco de farra dei uns tirinhos, sem qualquer sucesso. Foi quando um espevitado chegou, muito falante e maneiroso. Informou-se do preço dos tiros e, com gestos largos, à John Waine, assumiu uma das espingardas, introduziu nela a pequena seta e...

Senhores, quem já mexeu com essas armas provavelmente sabe que, com o tempo e sem manutenção, elas costumam apresentar um defeito, ou seja, quando o cano dobrável é retornado à posição de tiro elas inadvertidamente disparam. Pois não havia desastre maior para acontecer. Quando o espevitado conduziu o cano da arma à sua condição de tiro ela disparou sem qualquer aviso, indo a pequena e maldosa seta chocar-se exatamente com a garrafa de champanhe, com o prêmio máximo do estabelecimento, com a joia da coroa daquele micro e falido reino, a qual desmanchou-se em uma cascata de espuma, que desceu pela prateleira, deteriorando alguns outros prêmios de segunda e terceira importância.

O microempresário tentou responsabilizar o espevitado, que defendeu-se com acerto, alegando o defeito da arma. O microempresário me comoveu, ao desmanchar-se em lágrimas, como o seu champanhe, diante do "grande" prejuízo. Fiquei muito a pensar na relatividade das grandezas, das pessoas, das coisas.

* Roberto Costa é associado do Avaí FC. Foto acima: Werner Mathi

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