Bom dia, Azurras!
O TEMPO DO VOO - by Janio de Freitas
Janio de Freitas – Folha de São Paulo, 30 de dezembro de 2001.
Olhavam-nos com olhos ternos e, acada novo entímetro que adquiríssemos, diziam mais para si mesmos do que para alguém ouvir: "Meu Deus, como o tempo voa". Uma espécie de suspiros em palavras.
Menos do que a persistência do comentário imutável,
era a sua ideia que nos intrigava. Não fazia sentido. Os dias e os anos
passavam lerdos e indiferentes, nem se notava o tempo. Bem, o final das
férias trazia uma certa ansiedade cronológica, mas era o desejo de que o
tempo fosse ainda mais lento, se possível, parasse depressa onde
estava. Desejo, convenhamos, justo e justificado.
Mas não era de
todo absurda a nossa estranheza com aquela história de tempo voando,
sempre voando. Uma teoria científica – o que, reconheço, já é motivo
suficiente para se ficar meio desconfiado – pretende que a sensação de
passagem mais veloz do tempo vem de uma alteração que acomete os
neurônios com a idade. Quer dizer, o tempo se atrapalha com o passar do
tempo.
O tempo, seja lá o que sobre ele pensem os físicos e os
filósofos desinteressados do planeta e seus habitantes, é uma ideia que a
noite e o dia fizeram a gentileza de oferecer aos homens, para dar
alguma ordem às suas perplexidades diante do desconhecido e
incompreensível. O tempo é da família do além, da vida eterna, da alma e
de outras maravilhas.
Aí estamos diante de mais um ano de mais
um século desta mágica mental que é o tempo. Mas o tempo que nos diziam
voar, quando nos parecia parado, era outro. Não era o tempo, era uma
estranha sensação, a mais demorada das sensações que a existência nos
traz. Aquele tempo nada mais é do que a sensação indescritível de que a
vida se esvai. A vida, ela sim, a vida é que voa. Os que vemos chegarem,
crescerem, nos avisam do nosso voo tão veloz, tão inacreditavelmente e
incontrolavelmente curto.
Lá se foi, voando aos turbilhões, a
passagem do século. E lá se vai, no embalo do voo, um ano a mais. Ou a
menos. Dizer se foi bom ou não, exigiria dizer para quem terá sido bom
ou não. E seria mergulhar nas obviedades que compõem uma prova
tipicamente brasileira de que o tempo não passa. Prever se o ano próximo
será bom ou não, já é mais fácil: terá, como todos os anos, coisas boas
e outras não. E este é o máximo que se pode prever sem presunção.
Seja
como for, passará depressa. Logo haverá outro André, outro João, e
Flávia e Marina crescerão depressa, e a nós outros só compete olhá-los a
todos com a melhor de nossas ternuras e dizer-nos, talvez com pesar,
talvez sem lamento: meu Deus, como o tempo voa.
Os meus votos de
um ano que voe com mansidão. E o agradecimento aos que me concederam,
durante o voo que se completa, o seu convívio, a sua palavra de ajuda ou
a atenção neste recanto.
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