INESQUECÍVEL, JOGUEI COM O ZAGALO, by Roberto Costa

Zagallo, no jogo Brasil x Inglaterra, Copa do Mundo de 1962

Joguei futebol com o Zagalo. Dissipem qualquer efeito de impacto, não foi com aquele ponta-esquerda formiguinha da seleção, cujo futebol nunca deslumbrou a nós, torcedores, que o tivemos de engolir.


O Zagalo de que falo foi Nelson Wagner, ilhéu com sobrenome de gênio da música e, coincidentemente, compositor. Nunca soube a razão do apelido.


Era zagueiro de área do nosso time de juventude, eminentemente técnico, jamais vimos dele uma só jogada desleal. Era de boa índole, um pacificador nato. Pautava-se por sólidos princípios, creio que até religiosos e o futebol que jogava ratificava o seu caráter. Zagalo ganhava todas na bola. Vítima de enfarto, partiu da vida precocemente, creio que pela casa dos quarenta anos.


Sabemos todos da descontração de um ambiente de pelada, quase sempre tendo por palco algum campinho retirado, terreno fértil onde florescem e pipocam ao natural as chamadas palavras ditas de baixo calão, ali tão comuns como o feijão com arroz à mesa.


Pois aconteceu que, certa feita, década de 60, no meio de uma pelada renhida, dois primos dele participando, eis que nosso Zagalo, imediatamente após os dois primos xingarem-se recíproca e pesadamente numa dividida de bola, juntou a redonda com as duas mãos, lançou-a exasperadamente contra o chão e desabafou, num protesto grave e disciplinador:


- Porra! Será que vocês não conseguem jogar sem dizer palavrão, porra!


Caindo em si, emudeceu o nosso Zagalo, e suportou sem replicar o riso geral de toda a turma da pelada.


Um grande sujeito, um grande amigo, o Zagalo.

* Roberto Costa é associado do Avaí FC. Foto acima: Internet