terça-feira, 18 de agosto de 2015

DIA DE PESCARIA, by Roberto Costa

Por volta dos quarenta anos vez ou outra saía a pescar. Meu amigo, Guilherme Silva, então morador do Cacupé, descobrira na Praia do Sonho, logo após o Morro dos Cavalos, um esquema para pescar na Ilha da Fortaleza.

A Ilha da Fortaleza fica próxima à Ponta dos Papagaios e, pagando-se, conseguia-se que pescadores nos conduzissem pela manhã até ela, com o compromisso de ir buscar-nos por volta de cinco da tarde, ou mais cedo, em caso de aproximar-se alguma tempestade. Ruínas de uma fortaleza seguem resistindo ao tempo naquela pequena ilha rochosa, viveiro de garoupas.

Pois o domingo amanhecera iluminado, céu de brigadeiro. Colocamos as linhas no carro, as iscas, uma valise com sanduíches, refrigerantes e tocamos para o sul. Na chegada, com facilidade encontramos um jovem pescador para conduzir-nos em sua baleeira. O rapaz inspirava confiança, sendo forte e jovem, contávamos que tivesse a intrepidez dos homens acostumados às labutas do mar, o que não se confirmou.

Colocadas nossas poucas tralhas na baleeira embarcamos e seguimos em direção à ilha, ao som do barulho seco e repetitivo do motor. Ainda a meio caminho, não sei até hoje por que cargas d`água, o motor apagou. Tudo bem, estamos flutuando, pensei. O pescador muniu-se daquela cordinha com a qual faz o motor dar partida e iniciou o trabalho. Puxava a cordinha, o motor virava, mas não pegava. Tudo bem, estamos flutuando, pensei de novo. Mas o barco balançava e percebi que movia-se à deriva, ao sabor da correnteza e respingos de água salgada nos atingiam.

O motor seguiu recusando-se a pegar, o barco fugia de sua rota necessária, e percebi que o pescador  cansava e começava a dar mostras inequívocas de preocupaçõs. Ele deveria ser o último a mostrar nervosismo, não deixar que seus medos contaminassem os passageiros. Mas o que esperar de um jovem pescador de beira de praia? Que em caso de naufrágio fosse o último a abandonar o barco? Mas se nem o Schettino, comandante do Costa Concórdia honrou esse compromisso... Enfim, o motor pegou, para alívio de todos, o pescador redirecionou o barco e conseguimos chegar à ilha. 

Ao fim da tarde, conforme combinado, nosso jovem comandante aportou e, com umas doze garoupetas pescadas ingressamos a bordo da baleeira, iniciando nosso caminho de volta. Então meu amigo Guilherme saiu-se com esta: "Beto, vamos fazer assim, eu levo os peixes pra casa, lá a gente vai fazer um caldo, compramos umas cervejas e jantamos. Tu passas em casa e pegas a tua mulher." Combinado, eu disse.

Minha mulher exultou com a ideia. Arrumou-se, até reclamei com a sua demora, afinal não era um jantar em casa de estranhos, qualquer traje é válido, eu disse. Eu sei que não é bem assim, mas disse. Então saímos e lá chegando, enquanto as mulheres se cumprimentavam, percebi em meu amigo um riso meio esquivo, indefinido, de canto de boca. Ele disse: "Beto, não imaginas o que aconteceu, minha mulher alegou que está cansada e que acha um absurdo limpar peixe num domingo à noite. Concordei com ela. Também estou cansado, então fui à venda do Zé do Cacupé e pedi a ele que limpasse os peixes pra mim, ele riu da minha cara e sugeriu que eu levasse duas latas de feijoada em conserva, as últimas que ele tinha pra vender. Foi o que eu fiz. Já estão à mesa nos esperando, quentinhas, vamos sentar?"

* Roberto Costa é associado do Avaí FC. A charge é do nosso saudoso amigo Mausé e do próprio Roberto Costa.

6 Comentários:

Anônimo disse...

Nesse dia de pescaria, no desepero, com o barco à devira, no balanço que as ondas provocavam, RC prometeu.

- Se o motor do barco funcionar eu até torcerei para o Avaí.

E desde então RC cumpre a sua promessa.

Obs. As vezes ele muda para a Chapecoense ou Joinville, mas acaba voltando a torcer para o Avaí.

Forte Abraço.

Juca.

André Tarnowsky Filho disse...

Juca,

Estás redondamente enganado: RC sempre foi avaiano daqueles que assisti até aos treinos no saudoso Adolfo Konder.

Porém, a pergunta que não quer calar é: que fim levaram as garoupetas? Será que o Guilherme ficou com todas? hehehehe

Haja caldo, hein, RC?

Roberto disse...

ANDRÉ, Imagina sair de casa na expectativa de um caldo de garoupa, de peixes que nem foram ao gelo, coisa de primeira e ter que se contentar com feijoada de lata. Pior que isso só beber belco vestido com a camisa do figayrenC.

O istepô do meu amigo também ficou muito vexado com o acontecido e acredito que por isso nem se lembrou de sugerir a divisão dos peixes. Eu me lembrei, mas por educação não falei nada. Faz tempo não falo com ele, sei que separou-se, parece que morou no Rio e perdi contato. Mas no primeiro encontro com ele vou pedir explicações. Certamente fez o caldo no dia seguinte e comeu com a família. RC

André Tarnowsky Filho disse...

RC,

Faz parte da vida...

Bela história e grande narrativa!

Abraço!

José Antônio disse...

É um "monstro". Sensacional !
Inclusive nas respostas ao suposto torcedor do Figueirense.

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