terça-feira, 3 de maio de 2016

Leicester: da permanência ao sonho de campeão

Ainda que muitos da imprensa especializada insistam em não lembrar, o feito do Leicester, campeão inglês dessa temporada, invicto e com duas rodadas de antecedência, já aconteceu em várias partes do mundo, e até por aqui, quando tivemos Bahia, Sport, Coritiba e Atlético-PR, todos fora do eixo da grande mídia nacional, conquistando o principal certame nacional.

Trazendo para o nosso chão, se poderia perguntar qual a razão de nenhum time de Santa Catarina ter conquistado a nossa "primeira divisão", ainda que Avaí, Criciúma e Joinville já tenham títulos das outras divisões?

As respostas podem ser das mais variadas. Porém, o grau de responsabilidade de um jogador que disputa a Primeira Liga inglesa é bem diferente desses boleiros descompromissados que tem aparecido por aqui...

Na Bom dia, Azurras de segunda-feira dei um pequeno exemplo do "compromisso" dos boleiros avaianos, mas não é privilégio só do Sul da Ilha, basta ver o DM "doladelá"...

Aqueles 7 a 1 da Alemanha tiveram sua razão de ser...

Se a carta do italiano Cláudio Ranieri, técnico do Leicester, aos seus jogadores, quando faltavam seis rodadas para os Foxes alcançarem o sonho...




Eu me lembro do primeiro encontro com o presidente,
logo que cheguei ao Leicester City neste verão. Ele sentou comigo e disse: “Claudio, este é um ano muito importante para o clube. É muito importante que continuemos na Premier League. Não podemos cair!” Minha resposta foi: “Ok, claro. Trabalharemos forte nos treinamentos e tentaremos conquistar isso.”

Quarenta pontos. Esse era o objetivo. Esse era o tanto que precisávamos para ficar na primeira divisão. Para dar aos nossos torcedores outra temporada de Premier League. Na época, eu nem sonhava que poderia abrir o jornal do dia 4 de abril e ver o Leicester no topo da tabela, com 69 pontos. Ano passado, nesse mesmo dia, o clube estava na última posição.

Inacreditável.

Eu tenho 64 anos, não costumo sair muito. Estou com minha esposa há 40, então, nos dias de folga, procuro ficar com ela. Costumamos ir ao lago perto de casa ou, se estivermos em um momento aventureiro, assistimos a um filme. Entretanto, ultimamente, tenho, de fato, escutado o barulho que vem de todas as partes do mundo. É impossível ignorar. Ouvi até que nós temos alguns seguidores na América.

Para vocês, eu digo: bem-vindos ao clube. Estamos felizes em tê-los. Quero que vocês gostem da forma como jogamos futebol e quero que ame meus jogadores, pois a jornada deles é inacreditável.

Talvez vocês já tenham escutado alguns nomes. Jogadores que eram considerados tão pequenos ou tão lentos para outros grandes clubes. N’Golo Kanté. Jamie Vardy. Wes Morgan. Danny Drinkwater. Riyad Mahrez. Quando cheguei para o meu primeiro dia de treino e vi a qualidade desses jogadores, entendi quão bons eles poderiam ser.

Bem, sabia que teríamos uma chance de sobreviver na Premier League.

Esse tal de Kanté, ele corria tanto que pensei que tinha baterias debaixo de seus shorts. Nos treinamentos, ele não parava nunca.

Tive que dizer para ele: “Ei, N’Golo, vai com calma. Calma lá. Não corra na frente da bola o tempo todo, ok?”

Ele me respondeu: “Sim, chefe. Sim. Ok.”

Dez segundos depois, olhei e lá estava ele correndo de novo.

Eu disse a ele: “Um dia, vou vê-lo cruzando uma bola e você mesmo finalizando seu próprio cruzamento, com uma cabeçada.”

Ele é inacreditável, mas não é nosso único segredo. Temos tantos pontos fortes para nomear nesta incrível temporada.

Jamie Vardy, por exemplo. Ele não é um jogador de futebol. É um cavalo fantástico. Ele precisa estar livre no campo. Eu digo para ele: “Você é livre para se mover para onde quiser, mas precisa nos ajudar quando perdemos a bola. Isso é tudo o que te peço. Se você começar a pressionar o adversário, todos os seus companheiros vão te acompanhar.”

Antes de jogarmos nossa primeira partida da temporada, eu disse aos jogadores: “Quero que vocês joguem por seus companheiros. Somos um time pequeno, então temos que lutar com todo nosso coração, com toda nossa alma! Não me importo com o nome do adversário. Tudo o que quero é que vocês lutem! Se eles são melhores que nós, Ok. Parabéns para eles. Mas eles terão de nos mostrar que são melhores.”

Existia uma eletricidade fantástica em Leicester desde o primeiro dia. Começava com o presidente e passava pelos jogadores, pelo staff, pelos torcedores. Foi inacreditável o que senti. No King Power Stadium existia uma energia incrível.

Os torcedores cantam quando nós temos a bola? Ah, não, não, não. Quando estamos sob pressão, os fãs entendem nossa dor e cantam com seus corações! Eles entendem a complexidade do jogo e quando os jogadores estão sofrendo. Eles são muito, muito próximos a nós.

Iniciamos a temporada muito bem. Mas nosso objetivo, repito, era salvar o clube do rebaixamento. Nos primeiros nove jogos, estávamos ganhando, mas sofríamos muitos gols. Tínhamos que marcar dois ou três para ganhar todo jogo. Isso me preocupava muito. Antes de todo jogo, eu dizia: “Vamos lá, pessoal! Quero um clean sheet [jogo sem levar gols] hoje.” Nenhum clean sheet. Tentei todo tipo de motivação.

Então, finalmente, antes do jogo contra o Crystal Palace, eu disse: “Vamos lá, pessoal! Pago uma pizza se vocês conseguirem não sofrer gol hoje.”

Obviamente, meus jogadores conseguiram o clean sheet contra o Crystal Palace. Um a zero. Cumpri com minha promessa e levei meus jogadores ao Peter Pizzeria, na Leicester City Square. Mas guardei uma surpresa para quando eles chegassem lá. Falei: “Vocês têm trabalhado por tudo. Vocês vão trabalhar por suas pizzas também. Nós mesmos a faremos.” Fomos para a cozinha com a massa, o queijo e o molho. Fizemos tudo. Estava muito bom, também. Comi várias fatias. O que posso dizer? Sou italiano. Eu amo minha pizza e minha massa!

Agora, temos um monte de jogos sem sofrer gols. Na verdade, uma dúzia de clean sheets depois da pizza. Não acredito que seja coincidência.

Faltam seis jogos e temos que continuar lutando com nossos corações e nossas almas. É um clube pequeno que está mostrando ao mundo o que pode ser conquistado com espírito e determinação. Vinte e seis jogadores. Vinte e seis cérebros diferentes. Mas um só coração. Alguns anos atrás, muitos dos meus jogadores estavam em ligas menores. Vardy trabalhava em uma fábrica. Kanté jogava na terceira divisão francesa. Mahrez estava na quarta divisão da França.

Agora, estamos lutando por um título. Os torcedores do Leicester que encontro nas ruas dizem que eles estão sonhando. Mas digo a eles: “Ok, sonhem por nós. Nós não sonhamos. Nós simplesmente trabalhamos pesado.”

Não importa o que aconteça no fim desta temporada, penso que nossa história é importante para todos os fãs de futebol em todo o mundo. Isso dá esperança para todos os jovens jogadores que já escutaram que não são bons o suficiente.

Eles podem dizer para eles mesmos: “Como posso chegar ao topo? Se Vardy conseguiu, se Kanté conseguiu, talvez eu também consiga.”

Do que você precisa?

Um grande nome? Não.

Um grande contrato? Não.

Você precisa apenas manter a mente aberta, o coração aberto, as baterias recarregadas e correr livre.

Quem sabe? Talvez, ao final da temporada, nós teremos duas festas da pizza.

2 Comentários:

Anônimo disse...

Carlos Avaiano

Em 2009, com esse mesmo Silas de treinador, ficamos a poucos pontos do Flamengo campeão naquele ano, sendo que em 8 ou 9 jogos onde ganhávamos de 2x0, faltou coragem pro Silas e recuou o time permitindo o 2x2 em todos eles, foram os pontos nescessarios para passar o Flamengo é ser o grande campeão.
Quando falta ambição de querer subir os degraus mais altos da vida, ficamos pelo caminho e com aquele gostinho de que poderíamos ter conseguido algo mais.

André Tarnowsky Filho disse...

Carlos Avaiano,

Em 2009, o time de Silas só deslanchou na medida em que, com aval do Zunino, ele foi emparedado pelo LA, Cândido e Eduardo Gomes, a colocar o Léo Gago no time no lugar do volante Wendell...

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